segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

DOS NATAIS

Por melhor que seja o vinho,
por farto que seja o champagne,
o Natal é uma festa nostálgica para os adultos,
feliz para as crianças bem alimentadas,
trágica para os miseráveis e incompreensível
para os filhos dos miseráveis.
No Natal acordam todas as nossas fraquezas,
se abatem nossas grandezas e há uma dolorosa
desorganização dos sentimentos.
Os amigos são os mesmos, mas nos chegam como outros,
quase estranhos e, no entanto, mais amigos.
Os inimigos, parece, deixam de existir e, no entanto,
são apenas esquecidos durante o vinho.
Estranhamente, os mortos parecem tomar lugar à mesa,
brindar e participar dos abraços e até mesmo chorar
as mesmas lágrimas dos que festejam a vida.
Não consigo me emocionar quando, por exemplo,
vejo alguém sorrir, com tanta gente falar,
em tantos braços tocar e em tantos olhos, olhar.
Sangro, pois todo amor com data marcada me fere,
todo beijo formal me cega, todo corpo sem calor
me lacera, todo amor de encomenda me ensandece.
Tanto maior a festa da cristandade, mais profundo
parece ser o abismo em que se perdem os que
disputam restos de alimentos com cães e ratos,
mais fantástico parece ser o universo dos que têm
cheiro de lixo, mais sem rumo é o mundo
dos desprezados e mal-nascidos.
Penso em como poderiam ser diferentes os natais...
afinal todos temos direito ao mundo...
e ao céu também!

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