segunda-feira, 28 de abril de 2008

O CONTRÁRIO DO AMOR

O contrário de bonito é feio, de rico é pobre,
de preto é branco,
isso se aprende antes de entrar na escola.

Se você fizer uma enquete entre as crianças,
ouvirá também que o contrário do amor é o ódio.

Elas estão erradas.
Faça uma enquete entre adultos
e descubra a resposta certa:
o contrário do amor não é o ódio,
é a indiferença.

O que seria preferível,
que a pessoa que você ama passasse a lhe odiar,
ou que lhe fosse totalmente indiferente?

Que perdesse o sono
imaginando maneiras de fazer você se dar mal
ou que dormisse feito um anjo a noite inteira,
esquecido por completo da sua existência?

O ódio é também uma maneira
de se estar com alguém.

Já a indiferença
não aceita declarações ou reclamações:
seu nome não consta
mais do cadastro.

Para odiar alguém,
precisamos reconhecer que esse alguém existe e
que nos provoca sensações,
por piores que sejam.

Para odiar alguém, precisamos
de um coração, ainda que frio, e
raciocínio, ainda que doente.

Para odiar alguém gastamos energia, neurônios e tempo.

Odiar nos dá fios brancos no cabelo,
rugas pela face e angústia no peito.

Para odiar, necessitamos do objeto do ódio,
necessitamos dele nem que seja
para dedicar-lhe nosso rancor, nossa ira,
nossa pouca sabedoria para entendê-lo
e pouco humor para aturá-lo.

O ódio, se tivesse uma cor, seria vermelho,
tal qual a cor do amor.

Já para sermos indiferentes a alguém,
precisamos do quê?
De coisa alguma.

A pessoa em questão pode saltar de bung-jump,
assistir aula de fraque,
ganhar um Oscar
ou uma prisão perpétua,
estamos nem aí.

Não julgamos seus atos,
não observamos seus modos,
não testemunhamos sua existência.

Ela não nos exige olhos, boca,
coração, cérebro:
nosso corpo ignora sua presença,
e muito menos se dá conta de sua ausência.

Não temos o número do telefone
das pessoas para quem não ligamos.

A indiferença, se tivesse uma cor,
seria cor da água, cor do ar, cor de nada.

Uma criança nunca experimentou essa sensação:
ou ela é muito amada,
ou criticada pelo que apronta.

Uma criança está sempre em uma
das pontas da gangorra,
adoração ou queixas,
mas nunca é ignorada.

Só bem mais tarde,
quando necessitar de uma atenção
que não seja materna ou paterna,
é que descobrirá que o amor e o ódio
habitam o mesmo universo,
enquanto que a indiferença
é um exílio no deserto.

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