Guardei um pouco de liberdade dentro da lembrança,
escondi algumas letras do velho dicionário,
não atendi quando me proibiram de falar do fogo,
nem quando no rio os barcos afundaram no meio.
Não tenho nenhum dinheiro para pagar a luz da lua,
vendi meu último beijo, troquei metade por paixão,
o medo, larguei noutra esquina onde morava minha amante,
não me defendi da chuva, deixei que lavasse minha alma.
Ontem me proibiram de sorrir depois de fazer amor,
caminhei pelas ruas dos pensamentos daquela menina,
era uma tarde, quase amanhecer da minha loucura
e amei, como se fosse proibida, como se fosse minha.
Por hora fica permitido a tristeza, talvez de saudade,
quem um dia não abriu uma gargalhada de chorar,
não conheço homem sem lágrimas, nem tão alegre,
como a garoa de uma manhã que vem sem aviso.
Ainda caminho a procura do meu outro pedaço de vida,
enquanto o suor desce o rosto, a ternura pára,
como se nada mais fosse ter calor por perto e ao redor,
como se nenhum dia voltasse a amar uma mulher.
Pareço triste na minha prosa, não sou completo como Deus,
carrego minha bandeira da fome, as carências do sentimento,
tenho lágrimas e também água pra dividir com o irmão,
como se todos fossem botões de flores que não abriram.
Os sonhos do poeta são irrevogáveis, como a sombra dos dias,
alimento de almas, sobremesa de espíritos que vaga os corpos,
como o cordeiro que corre nos sonhos da menina moça,
que depois vira cavalo branco montado por outro homem.
Depois do sol, guardarei meus girassóis em uma caixa dourada,
colocarei na janela meu lenço de linho pra lua tingir de prata,
deixarei o vento varrer do terreiro as folhas de ontem,
como se limpasse o peito das tristezas de um dia que acaba.
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