terça-feira, 2 de novembro de 2010

ESTÁ NA HORA DE PARAR

Toda sexta-feira à noite começa o shabat para a tradição judaica.



Shabat é o conceito que propõe descanso ao final do ciclo semanal de produção,



inspirado no descanso divino, no sétimo dia da Criação.



Mostrar tudo muito além de uma proposta trabalhista,



entendemos a pausa como fundamental para a saúde de tudo o que é vivo.



A noite é pausa, o inverno é pausa, mesmo a morte é pausa.



Onde não há pausa, a vida lentamente se extingue.



Para um mundo no qual funcionar 24 horas por dia parece não ser suficiente,



onde o meio ambiente e a terra imploram por uma folga,



onde nós mesmos não suportamos mais a falta de tempo,



descansar se torna uma necessidade do planeta.



Hoje, o tempo de 'pausa' é preenchido por diversão e alienação.



Lazer não é feito de descanso,



mas de ocupações 'para não nos ocuparmos'.



A própria palavra entretenimento indica o desejo de não parar.



E a incapacidade de parar é uma forma de depressão.



O mundo está deprimido e a indústria do entretenimento cresce nessas condições.



Nossas cidades se parecem cada vez mais com a Disneylândia.



Longas filas para aproveitar experiências pouco interativas.



Fim de dia com gosto de vazio.



Um divertido que não é nem bom nem ruim.



Dia pronto para ser esquecido,



não fossem as fotos e a memória de uma expectativa frustrada



que ninguém revela para não dar o gostinho ao próximo.



Entramos no milênio num mundo que é um grande shopping.



A Internet e a televisão não dormem.



Não há mais insônia solitária; solitário é quem dorme.



As bolsas do Ocidente e do Oriente se revezam fazendo do ganhar e perder,



das informações e dos rumores, atividade incessante.



A CNN inventou um tempo linear que só pode parar no fim.



Mas as paradas estão por toda a caminhada e por todo o processo.



Sem acostamento, a vida parece fluir mais rápida e eficiente,



mas ao custo fóbico de uma paisagem que passa.



O futuro é tão rápido que se confunde com o presente.



As montanhas estão com olheiras,



os rios precisam de um bom banho,



as cidades de uma cochilada,



o mar de umas férias,



o domingo de um feriado...



Nossos namorados querem 'ficar', trocando o 'ser' pelo 'estar'.



Saímos da escravidão do século XIX para o leasing do século XXI



- um dia seremos nossos?



Quem tem tempo não é sério, quem não tem tempo é importante.



Nunca fizemos tanto e realizamos tão pouco.



Nunca tantos fizeram tanto por tão poucos...



Parar não é interromper.



Muitas vezes continuar é que é uma interrupção.



O dia de não trabalhar não é o dia de se distrair -literalmente, ficar desatento.



É um dia de atenção, de ser atencioso consigo e com sua vida.



A pergunta que as pessoas se fazem no descanso é



'o que vamos fazer hoje?'



- já marcada pela ansiedade.



E sonhamos com uma longevidade de 120 anos,



quando não sabemos o que fazer numa tarde de Domingo.



Quem ganha tempo, por definição, perde.



Quem mata tempo, fere-se mortalmente.



É este o grande 'radical livre' que envelhece nossa alegria –



o sonho de fazer do tempo uma mercadoria.



Em tempos de novo milênio, vamos resgatar coisas que são milenares.



A pausa é que traz a surpresa e não o que vem depois.



A pausa é que dá sentido à caminhada.



A prática espiritual deste milênio será viver as pausas.



Não haverá maior sábio do que aquele que souber quando algo terminou



e quando algo vai começar.



Afinal, por que o Criador descansou?



Talvez porque, mais difícil do que iniciar um processo do nada,



seja dá-lo como concluído.

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