quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

"O PESO QUE A GENTE LEVA"

Olho ao meu redor e descubro que as coisas que quero levar
não podem ser levadas.
Excedem aos tamanhos permitidos.
Já imaginou chegar ao aeroporto carregando
o colchão para ser despachado?

As perguntas são muitas...
E se eu tiver vontade de ouvir aquela música?
E o filme que costumo ver de vez em quando,
como se fosse a primeira vez?

Desisto.
Jogo o que posso no espaço delimitado para minha partida e vou.
Vez em quando me recordo de alguma coisa esquecida,
ou então,
inevitavelmente concluo que mais da metade
do que levei não me serviu pra nada.

É nessa hora que descubro que partir
é experiência inevitável de sofrer ausências.

E nisso mora o encanto da viagem.
Viajar é descobrir o mundo que não temos.
É o tempo de sofrer a ausência que nos ajuda a mensurar
o valor do mundo que nos pertence.

E então descobrimos o motivo que levou o poeta cantar:
“Bom é partir. Bom mesmo é poder voltar!”
Ele tinha razão.
A partida nos abre os olhos para o que deixamos.
A distância nos permite mensurar os espaços deixados.
Por isso, partidas e chegadas são instrumentos
que nos indicam quem somos,
o que amamos e o que é essencial para que a gente continue sendo.
Ao ver o mundo que não é meu,
eu me reencontro com desejo de amar ainda mais o meu território.
É conseqüência natural que faz o coração querer
voltar ao ponto inicial, ao lugar onde tudo começou.

É como se a voz identificasse a raiz do grito, o elemento primeiro.

Vida e viagens seguem as mesmas regras.
Os excessos nos pesam e nos retiram a vontade de viver.
Por isso é tão necessário partir.
Sair na direção das realidades que nos ausentam.
Lugares e pessoas que não pertencem
ao contexto de nossas lamúrias...
Hospitais, asilos, internatos...

Ver o sofrimento de perto, tocar na ferida que não dói na nossa carne,
mas que de alguma maneira pode nos humanizar.

Andar na direção do outro é também fazer uma viagem.
Mas não leve muita coisa.
Não tenha medo das ausências que sentirá.
Ao adentrar o território alheio,
quem sabe assim os seus olhos se abram
para enxergar de um jeito novo o território que é seu.
Não leve os seus pesos.
Eles não lhe permitirão encontrar o outro.
Viaje leve, leve, bem leve.
Mas se leve.

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