segunda-feira, 26 de novembro de 2007

Passagem do Virtual para o Real

Para muitos, a passagem do virtual para o real é bastante dura.
Para outros, impossível.
Lembro-me dela, que não era ela, era ele.
Lembro-me dele que não tinha charme algum,
embora fosse um verdadeiro Don Juan no virtual.
Sabia lidar muito bem com as palavras escritas.

Lembro-me de toda aquela falsa alegria que vários deixaram transparecer
durante anos através das letras e que, no real, rolou ladeira abaixo.
Lembro-me de opções sexuais que não eram verdadeiras
e de amizades que não foram sinceras.

Lembro-me daquela loura fatal, sexy, sensual que enviava sempre suas fotos
causando frisson em muitos.
Trinta, trinta e cinco anos, talvez?
Não. Já era avó e beirava seus setenta anos.
As tais fotos eram de cerca de trinta anos atrás retocadas por um super photoshop.

Lembro-me de críticos literários.
Viviam de um sonho que possivelmente jamais concretizaram.

Lembro-me dos exaltados, ferozes, provocadores.
Verdadeiras ovelhinhas no real.

Lembro-me de profissões virtuais.
Médicos, Advogados, Engenheiros.
Seres reais que sequer tiveram a oportunidade de passar na porta de uma faculdade.

Lembro-me dos donos da verdade virtuais, apenas virtuais.
No real, não tinham opinião a respeito de nada.
Perdiam-se dentro das suas próprias dúvidas.

Lembro-me dos intelectuais, vários, a maioria de porta de buteco.
Lembro-me de amores que jamais passaram para o real pois no virtual já eram impossíveis.
Se bem que necessários.

Lembro-me do caráter dos seres virtuais.
Como distinguir os bons e os maus?
Ainda não existe em nenhum computador uma peça que se encaixe
e faça uma luz vermelha ou verde piscar a cada e-mail que entra
na nossa caixa de correio nos dando a informação que precisamos.

Lembro-me dela que tomou ele da outra e dessa mesma outra que nunca foi dele.
Mas havia quem dissesse - Ele é meu! Ela é minha!

No virtual, ninguém nunca foi de ninguém e quando chegaram ao real, poucos foram de alguém.

Lembro-me dos formadores de opinião e das vaquinhas de presépio.
Lembro-me da unanimidade virtual, talvez a única coisa real.
Lembro-me de enigmas. É assim ou assado? É falso ou verdadeiro?
E lembro-me dos especialistas em enganar, trapacear, provocar.

Lembro-me dos ofendidos, feridos que sangravam virtualmente até não poder mais.

Lembro-me das doenças virtuais(?), das mortes(?), das fugas e dos sumiços.
Seres que nem mesmo no virtual conseguiram sustentar seus personagens.

Lembro-me dos ódios e intrigas. Quem seria o vilão e a vítima? Jamais saberei.

Lembro-me de mim, em meio a um tiroteio invisível e a um carinho duvidoso.
Lembro-me tão bem das carências excessivas que desabrochavam em palavras dolorosas.

Lembro-me da criança que era um adulto e do adulto que era uma criança.
Lembro-me da ofensa, da necessidade de denegrir a imagem de pessoas
que incomodavam a outras pelo simples fato de se destacarem virtualmente.

Lembro-me, finalmente, que o virtual jamais conseguiu ser real
e que o real vivia a anos luz do virtual.

Depois de lembrar-me de tudo isso chego a conclusão que apenas sei
que nada sei sobre o mundo virtual, assim como ninguém sabe.

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