quarta-feira, 19 de novembro de 2008

UMA DE MUITAS HISTÓRIAS DA MINHA VIDA

Eu sou uma pessoa alegre desde criança e sempre gostei de imitar os artistas. Eu adorava o circo e dizia que quando crescesse seria trapezista.
Na minha infância, só gostava de brincadeiras perigosas, porque eu era atrevida e extrovertida... Eu adorava carrinhos de rolimã e deixava meus pais desesperados, pois não gostava de brincar com bonecas e de casinha; eu gostava de jogar queimado, de brincar de pique bandeira, de esconde-esconde. Eu era um pouco aventureira..

Aos quinze anos, eu li em um jornal que estavam precisando de artistas para encenação da peça "O Colecionador". Nada disse em casa. No dia seguinte, acordei cedinho - uma novidade, pois estava em férias e aproveitava para dormir até mais tarde -, me vesti e fui até o Teatro... Lá chegando, havia uma enorme fila de pessoas, todas adultas, maquiadas; pareciam artistas. Sem chance! Falou a razão. Minha teimosia e impetuosidade replicaram: Com chance!

Eu passei pela fila e fui entrando, normalmente, como alguém que trabalhava e conhecia e bem o local. Estava bem segura, não vacilava. Nada me detinha, porque eu estava determinada. Aproximei-me de um rapaz que fazia os testes e lhe perguntei: O diretor já chegou? Por quê? Respondeu-me ele. Eu não perdi tempo usei de astúcia: Ele marcou, às nove horas comigo, para ensaiarmos a peça, e me pediu pontualidade; já são nove horas e meia e ninguém está pronto. Acho melhor nos prepararmos e começarmos já, pois se ele chegar e não nos encontrar ensaiando vai ficar nervoso. Você o conhece melhor do que eu! Mas - balbuciou o rapaz - ele me disse que viria uma moça mais velha para contracenar com o Heverton Guimarães! E você me parece muito jovem...

- Menino, chega de conversa e vamos agir que é melhor. Respondi-lhe num tom que não admitia revides.

Ele prontamente me deu o script e chamou o Heverton, que era meu contemporâneo de escola, três anos mais adiantado do que eu. Minha sorte foi que ele já havia me paquerado, embora sem sucesso, mas, nessa hora, eu sabia que precisava empregar todo o meu charme para obter o papel e a sua aprovação. Grande foi a sua surpresa quando me viu .

- Você por aqui? Veio assistir ao ensaio?

- Não, eu vim para trabalhar com você e acho bom começarmos logo, caso contrário, o diretor vai chegar e ficar muito zangado.

- Eu sou o diretor da peça e também vou atuar.

- Ora, querido, o que está esperando? Vamos começar logo esse bendito ensaio.

Não lhe dei chance de pensar, nem mesmo de recusar minha proposta e lá fomos nós..

Eu não sei se vocês assistiram à peça “O Colecionador”. É uma peça bonita, mas difícil de representar, pois são apenas dois autores e quase nenhum figurino. O primeiro ensaio foi um fracasso total! Pobre do meu amigo estava arrasado, mas eu levantei seu moral, joguei meu charminho e o convidei para almoçar comigo, em minha residência, e ele prontamente aceitou o convite.

Enquanto caminhávamos, eu pensava no que eu diria a minha mãe, pessoa totalmente contra a idéia de sua filha trabalhar em teatro. Nossa!... Moça de família que se preza nem pensa nessas coisas! Eu me armei de coragem e, enquanto papai se deliciava com seu prato predileto, galinha ao molho pardo com polenta, rapidamente eu lhe contei que por ter tirado ótimas notas na escola, o diretor tinha me escolhido para fazer uma peça de teatro, que seria apresentada no colégio, com a finalidade de angariarmos fundos para o baile de formatura; disse-lhe ainda que eu seria a oradora da turma.

Ele não cabia em si de contentamento, mas continuou saboreando seu prato preferido e mamãe nada comentou; apenas me perguntou a que horas e onde seriam os ensaios. Respondi-lhe que os ensaios seriam realizados no colégio, na parte da tarde, para não atrapalhar as aulas.

Conclusão, com mais uma de minhas teimosias, eu me tornei artista de teatro amador e fazia parte do grêmio estudantil. Entretanto, o fato mais pitoresco ainda está por vir.

Na peça, havia uma cena em que eu deveria brigar com o meu marido, abrir a porta e tentar sair correndo, ele tentaria me impedir e eu lhe daria uma bofetada. Essa tal bofetada ensaiada faz muito barulho, mas quem apanha não sente nada...

Porém, comigo tudo acontecia de modo diferente; tivemos um grande sucesso na primeira noite com casa lotada. A minha família toda, tias, avós, primos e a dele. Na segunda noite, alguns amigos nossos do colégio, mas insistimos e conseguimos com a nossa determinação ficar dois meses em cartaz, de quinta a domingo com casa cheia.

Mas, no último dia, no momento da “briga”, quando eu abri a porta levei uma bela cabeçada que me deixou tonta, e quando vi aquele homem partindo para cima de mim esqueci-me de que era ficção e dei-lhe uma bofetada com toda a força que possuía.

Fomos aplaudidos de pé, e imaginem o rosto do Heverton nos dias que se seguiram!

Pobre amigo, você também já nos deixou e lá de cima deve estar rindo de mim, sentada ao computador... Não mais aquela menina maluquinha que você conhecia tão bem, mas uma senhora de cabelos quase grisalhos, de óculos, brincando de ser escritora.

É, amigo, este texto é uma homenagem a você e fará parte do meu livro. Sabe, sempre gostei de contar histórias, de fazer vocês rirem, e não é por contar alguns aninhos a mais de existência que perdi o tesão, não! Eu ainda sou meio maluquinha, alegre, extrovertida, mas um pouco moderada, contida... Afinal, não tenho mais meus lindos dezoito anos!

Vivi a vida e não permiti que ela me vivesse, por isso, continuo feliz... Num dia chorando, no outro sorrindo, porque assim é a vida!

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